quinta-feira, 16 de abril de 2009

Segredo?!

- Segredo?! - repeti eu com espanto, perante a questão do meu amigo - Não há nenhum segredo para a felicidade em Sulus, meu bom Pelarus.

Continuávamos sentados num banco de mármore, no estreito parque que se estendia ao longo da margem, entre o rio e o casario da cidade. Um local aprazível, que a população utilizava para as mais variadas actividades de lazer e descontracção.

- Pois é, meu caro - continuei - em Sulus não temos uma fórmula secreta ou mágica, para a felicidade e bem-estar da nossa sociedade. Mas temos sim um princípio que está na base de tudo o que fazemos, e ele é a auto-estima, ou amor-próprio como queiras chamar.
Podes afirmar que valorizamos acima de tudo a Educação, mas dirigida no sentido do desenvolvimento da auto-estima. E tal acontece desde bem cedo. Desde o berço diria mesmo.

- E porquê?! Porque só alguém com um saudável amor-próprio sabe fazer as melhores escolhas, para si próprio e para os outros.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Bolhas-Horta

Sim, meu caro Pelarus, entendo perfeitamente o teu desapontamento e até tristeza, que sentes perante a constatação de como seria tão fácil o teu mundo ser tão belo e harmonioso quanto Sulus. Mas isso depende da vontade e colaboração de todos. O que me parece um pouco difícil de conseguir entre vós.

Já falámos da nossa estrutura de habitação comunitária. Contudo creio ainda não te haver referido que em cada condomínio existem áreas de cultura hidropónica que produzem alimentos para essa comunidade e para o mercado local. Desse modo não necessitamos de muito solo para a produção agrícola, uma vez que ela pode ser feita na vertical, distribuída por vários pisos dos diferentes edifícios. 
Chamamos tais unidades de blocos hidropónicos (ou mais prosaicamente de bolhas-horta) e ocupam todo um piso com paredes envidraçadas, para que as plantas obtenham toda a luz natural de que necessitam e também para as manter num ambiente atmosférico controlado. 

Além da utilidade imediata de produção alimentar, essas áreas de cultivo vegetal têm também uma função de lazer e descontração, para os ocupantes desses edifícios e também para os visitantes. É uma das acções derivadas do nosso lema primordial de que cada comunidade ou grupo social deve procurar ser o mais autónomo possível. 

Do mesmo modo os nossos jardins não servem apenas para decoração, mas igualmente para a produção de vegetais e flores comestíveis, que entram na nossa dieta alimentar tradicional. Assim alimentamo-nos também de beleza.

E é também através da cultura hidropónica que conseguimos que as nossas cidades-flutuantes sejam autónomas na produção de alimentos de origem vegetal.
Sim, meu querido,- me apressei a confirmar perante o olhar de espanto de Pelarus - sei que ainda não te havia falado nas cidades flutuantes. Apenas temos deambulado por Sulus. Oportunamente falaremos dessas maravilhosas cidades flutuantes.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Junto ao rio

Eu e Pelarus caminhámos ao longo da larga alameda que descia da praça central da cidade até ao rio.

Dum lado e doutro da larga avenida árvores proviam sombra para os nossos passos lentamente cadenciados. A relva sob os nossos pés era fresca e repousante. O clima ameno de Sulus não exigia vestes elaboradas e pesadas, pelo que vestíamos apenas túnicas de fino linho e as nossas jóias distintivas.

Chegados à margem do rio, sentámo-nos num murete de mármore à sombra. 
E ficámos olhando as águas no seu contínuo fluir. Tal como a vida; em frente sem retorno.

A brisa corria, levando o silêncio consigo.

Pelarus despertou-me do meu torpor mudo, ao que respondi:
- Porque estou tão pensativo, meu caro?! Porque amigos meus sofrem lá longe. E meu coração chora com eles. 
Mesmo num mundo ideal a vida não é perfeita.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Exército

- Se há exército em Sulus?! Oh meu bom Pelarus, mas porque havia de existir um exército se ninguém quer fazer guerra?

- Para defesa?! Mas defender de quê? De quem? Sulus não tem inimigos nem pretende vir a tê-los. Em Sulus não há militares, há monges! - concluí sorrindo.

Contudo há em Sulus algo que se pode equiparar a um serviço militar obrigatório; trata-se dum serviço formativo de iniciação dos jovens e que alguns assumem como carreira para o resto de suas vidas. 
Todos os jovens têm que cumprir um período de serviço monástico, em mosteiros longe das suas localidades de origem, portanto afastados do contacto com familiares e amigos. 
Durante esse período não só vivem em reclusão com rotinas monásticas, mas também são incumbidos da prestação de serviço comunitário. Assim se completa a formação dos jovens, iniciada desde cedo no sistema de ensino de Sulus. 

A prioridade dos cuidados de todos em Sulus é para a educação desde a mais tenra infância. Aqui todos são instruídos a viver em comunidade. Todos têm um contributo válido para a comunidade e a todos é dada a oportunidade de prestar esse contributo. 

Todos são iguais em direitos e oportunidades perante a comunidade, pelo que não há sentido de exclusão por más práticas. Os prováveis prevaricadores são objecto de mais atenção e cuidados por toda a comunidade, pelo que não existe aqui o estatuto de pária.

- Crime?! Se há crime em Sulus? - continuei respondendo às questões postas por Pelarus - Mas, meu querido, por acaso já viste em alguma parte de Sulus qualquer indício de insegurança?

Crime é um termo não utilizado por aqui. Podem acontecer comportamentos mais desajustados por parte de algum cidadão, mas logo a comunidade tratará de entender o porquê desse desajustamento e lidará com a situação do modo mais digno e conveniente. E isto significa com respeito e bonomia. 

Aqui respeita-se a dignidade humana acima de tudo. Tal exige uma co-responsabilidade de todos pelos comportamentos de cada um dentro da comunidade. 
A sociedade e a cultura de Sulus foram desenvolvidas segundo esse princípio soberano. Toda a atenção dos dignitários administrativos focaliza-se na preservação desse ideal primordial.

A todos é providenciado o essencial para uma existência digna, mesmo sem que para isso tenham que trabalhar. Quem quiser adquirir bens supérfluos, terá então de se esforçar mais para acumular bens próprios, mas isso não é visto como uma supremacia de estatuto social. Como já falámos anteriormente os responsáveis por cargos administrativos são impedidos da propriedade de quaisquer bens pessoais. 
Ademais a acumulação de riqueza é interdita em Sulus, pelo que a partir de determinados excedentes os bens acumulados passam para o usufruto da comunidade.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Quem Governa?

- Excelente questão essa, meu bom Pelarus. - sorria, enquanto lhe passava o braço sobre os ombros e caminhavamos pela praça principal de Sulus - "Quem governa?" - repeti a pergunta que ele me havia feito.

Ora essa é uma questão que nos pode levar a reflectir um pouco. Embora Sulus seja a capital dum reino, logo uma monarquia e todos os poderes estejam concentrados na pessoa do Soberano, não se pode dizer que seja uma Monarquia Absolutista. Eu diria que em Sulus, assim como por todo o Reino, cada um se governa a si.

O Soberano, ou Rei como lhe queiras chamar, é acima de tudo a personificação de todo o povo de Sulus. Ele é a pessoa em que cada um de nós se revê. É também ele o zelador do bem estar de todos os seus súbditos. Rei ou Rainha, pouco importa. No presente temos um Rei, mas o título é assumido por herdeiros e herdeiras.
Falando de herdeiros e reis, o Herdeiro do Trono de Sulus não tem de ser obrigatoriamente filho do Soberano em título. O Rei pode nomear o seu sucessor fora da Casa Real, bastando para tal que esse sucessor receba uma instrução preparatória para o governo, tal como a que os Príncipes de Sangue recebem. Mas geralmente é sempre o primogénito real o Herdeiro e, desde bem novo, recebe uma instrução especial, para no futuro assumir o posto de Soberano.

Em Sulus governa o Rei no interesse de todo o povo. E podes ver isso aqui na Praça do Palácio.
- Exacto, notaste bem. O Palácio Real está aberto e sem guardas. Qualquer um pode entrar no palácio.
- Porque não há guardas?! Ora, meu querido, porque todos os habitantes de Sulus zelam pelo bem estar do Seu Soberano, pois disso depende o seu próprio bem-estar. Um Soberano justo e guardião do bem-estar do seu povo não necessita de guardas armados para o proteger. O Povo é a sua melhor protecção.

- Corrupção?! - não pude deixar de dar uma risada por causa da interpelação do meu amigo. - Oh, meu caro Pelarus, isso não existe em Sulus!
Como?! Uma das primeiras medidas para o evitar é a de que ao Soberano e a toda a Casa Real (chamamos Casa Real à família em primeiro grau do Soberano) não é permitida a posse de bens pessoais. Assim o mesmo acontecendo com todos aqueles que desempenhem cargos ligados à governação e administração do Reino. Além disso a acumulação de riqueza excessiva não é permitida em Sulus.

- Não, não receamos que um Rei se torne despótico e impopular. Não esqueças que não há guardas à porta do Palácio Real. - ambos rimos - Demais o Rei não governa sozinho. As suas decisões são tomadas depois da consulta dum Colégio de Sábios e duma Corte composta por representantes de todas as cidades do Reino. Além de que o Rei tem uma agenda destinada a receber directamente os cidadãos que se lhe queiram dirigir pessoalmente. Para tal o Rei se desloca periodicamente por todo o Reino.

No Reino todos têm garantido o direito à sobrevivência. Isso implica que nem precisamos de trabalhar para podermos nos alimentar, ter uma morada e sermos assistidos em caso de doença. Em Sulus cada um é livre de se dedicar à função que preferir. Ninguém é coagido a trabalhar para sobreviver. Há trabalho para todos, os que queiram trabalhar e o empresariado é incentivado e apoiado pelo Estado, pelo que os lucros excedentes da actividade económica revertem a favor do Estado, logo a favor de todos.

Mas a base de tudo isso é a Educação. O pilar fundamental da sociedade de Sulus é a Educação.